
A passividade como metodologia de ensino
Eu tenho 22 anos de idade. Desse total de anos vividos, pelos menos 16 deles foram dedicados a minha educação, ou seja, cerca de 72% do total. Isso quer dizer que em grande parte da minha vida, eu estive inserida no ambiente escolar, em constante contato com professores, livros, apostilas, listas e mais listas de exercícios, intermináveis apresentações de trabalhos, entre outras coisas que envolvem tal ambiente.
Mas foram somente em dois momentos, dentre 16 anos, que me dei conta de que havia um problema na forma como eu havia aprendido grande parte do conteúdo dado no ambiente escolar.
O primeiro momento foi quando adentrei o ensino superior e me deparei com alguns professores cuja didática diferiam absurdamente do que eu estava acostumada; o segundo momento foi ao me graduar e tentar retomar os estudos, de forma autônoma, para me preparar para o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio).
Quando estamos no Ensino Médio, afirmações como “Na faculdade não tem essa moleza!”, “Se prepara que faculdade não é brincadeira”, “Não vai ter professor nenhum passando a mão na cabeça de vocês” nos assustam mas não nos fazem refletir o que de fato está por de trás delas. Ninguém nos conta que estas afirmações mostram que a metodologia de ensino, no Brasil, é, em grande parte, baseada em passividade. E que, ao sair do Ensino Médio, uma parte dessa passividade tende a ser quebrada, já que, na universidade, é esperado que os alunos busquem o conhecimento e não somente aguardem recebê-lo.
Que choque de realidade eu sofri ao entender que, por mais que os professores, na graduação, direcionassem os meus estudos, caberia a mim desenvolver uma metodologia que me fizesse compreender e relacionar textos, teorias e suas aplicabilidades, exercícios etc.
E hoje, em 2020, depois de quatro anos de graduação, ao tentar me voltar para um conteúdo que não estudo (e pratico) há anos, percebo-me novamente nesta posição de atordoamento: por onde devo seguir? o que funciona pra mim? como (e por onde) eu devo começar? Assinei planos de pré-vestibular online, imprimi listas de exercícios, mas em dois meses não consegui estudar nem 1% do que eu deveria ter estudado até agora. Eu acreditei por anos que era a aluna perfeita, mas me mostrei uma estudante medíocre e extremamente passiva.
E em meio a pandemia e decretos de isolamento social, percebi a dificuldade que a grande maioria dos alunos vão encontrar para dar continuidade aos seus estudos. A gente é ensinado, praticamente durante toda a nossa vida escolar, a esperar o direcionamento dos professores, a fazer somente os exercícios que nos são passados (vez ou outra surge um exercício-desafio, que, honestamente, poucos se dão ao trabalho de fazer). Não há preocupação em tornar alunos em estudantes ativos ao longo de sua jornada educacional.
E escrevo sobre isso pois considero cruel esperar que adolescentes e jovens, num momento tão delicado como atual, desenvolvam essa habilidade e se tornem agentes principais da sua educação. Não importa o quão bom eles sejam em sala de aula, isso não significa que estão prontos para lidar com a autonomia sobre sua própria educação.
Muito falamos sobre o ambiente e as ferramentas que adolescentes e jovens terão (ou não terão) para manter suas atividades educacionais em dia, mas esquecemos que antes mesmo desses aspectos, estamos lidando com uma população de alunos que não tem preparo algum para assumir tal responsabilidade.
Não culpo professores em momento algum. A passividade é uma metodologia de ensino no Brasil; é prática, é fácil, não exige atuação constante do Estado para atualização dos sistemas que a envolvem. Mas ela custa caro a longo prazo e a quem está sob seu efeito.
Não é sob o medo de repetir de ano que um jovem vai se tornar apto a se educar. É sob o direcionamento vindo do Estado, de professores, do ambiente escolar.
O status quo da Educação brasileira pode (e deve!) ser mudado. Mas não às custas de adolescentes e jovens despreparados.
Algumas observações:
- Sei que o MEC tem desenvolvido n ferramentas para contribuir para a educação à distância (única alternativa encontrada pelo governo, até o momento, para o fechamento das escolas) mas isso não é garantia de eficiência e qualidade de ensino. E, novamente, assumir a responsabilidade pelo seus estudos envolve muito mais do que ferramentas.
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